terça-feira, 8 de setembro de 2009

MATRIX E A JUSTIÇA


A Justiça está representada na imagem de uma mulher vendada, que tem em suas mãos uma espada e uma balança.


Ulpiano certa vez disse que Justiça é a vontade constante e perpétua de dar a cada um o que é seu (“justitia est constans et perpetua voluntas jus suUm cuique tribuendi”).


Assim, Justiça é um valor buscado e se manifesta no Direito através de seu conjunto de normas, regras e princípios, que interferem na conduta humana com ajustamento de comportamentos para pacificação social.


Por menor que seja, ou por mais insignificante que se acredite ser, um direito violado afronta valores inerentes à sociedade contemporânea.


Quando Ihering escreveu sobre a luta pelo direito, poder-se-ia dizer: lute pela Justiça!


Daí afirmar que quando se viola uma lei ou uma decisão judicial, a Justiça passa ser abstrata.


A Constituição Federal de 1988, no seu artigo 5º e incisos, contemplou vários princípios relativos à dignidade da pessoa humana.


Dentre esses princípios constitucionais destacam-se alguns de cunho processual, que a nosso ver são sinônimos da expressão da Justiça através do Direito: contraditório e ampla defesa.


Alguns operadores do direito contribuíram e ainda contribuem para essa abstração da Justiça, quando utilizam os princípios constitucionais supra, para obstruir o cumprimento de determinada decisão judicial.


O princípio do contraditório e ampla defesa, numa demanda judicial, asseguram às partes o direito de ser ouvido, de acompanhar todos os atos processuais, produzir provas; enfim, participar ativamente na vida daquele processo na defesa de seus interesses.


O comportamento ético das partes é meio mais efetivo para prestação jurisdicional em período razoável, e também reduz os custos com a demanda.


A probidade no manejo do exercício do contraditório e da ampla defesa consiste que seu uso seja feito de forma adequada e útil no desenvolvimento do processo.


Muito se tem atribuído a ineficácia das decisões judiciais à morosidade da Justiça.


Essa lentidão inútil, em grande parte, é decorrente da má utilização do processo pelas partes, sendo os princípios constitucionais supracitados instrumentos para incidência do abuso do direito de defesa de uma parte, que contrasta com um direito evidente da outra.


Tome-se, por exemplo, um caso que envolveu uma grande companhia aérea, que após um acidente de grandes proporções, mediante o uso indevido dos referidos princípios constitucionais chegou às instâncias superiores apenas para retardar o direito evidente daqueles que tiveram seus lares destruídos com a tragédia.


O uso indevido do direito de recorrer pela companhia aérea gerou indignação do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, que no bojo do recurso fez constar seu descontentamento com aquela prática:


Após tais considerações, que levam ao desacolhimento do recurso, não posso deixar de consignar a lamentável insensibilidade da recorrente, que, embora apregoando eficiência – que não se lhe pode negar -, não contribui para solucionar de vez essa parte do doloroso drama dos atingidos pelo triste acidente, preferindo recorrer judicialmente de uma decisão manifestamente razoável e bem lançada.


Cada vez mais, o direito de defesa deixou de ser a manifestação da Justiça para transformá-la numa “MATRIX”.


Pede-se vênia ao trocadilho, mas, manifestação tardia do Direito é uma denegação da Justiça.


Diante desta constatação, pergunta-se: até que ponto é viável buscar um valor, cujo seu instrumento de manifestação o torna um ser virtual?


A população de um modo geral – algo em torno de 65% - acredita piamente no Poder Judiciário mesmo com todos os problemas dele decorrente, conforme levantamento feito pela Fundação Getúlio Vargas.


Ela acredita que há um “NEO” que trará para o mundo real o valor intrínseco da Justiça.


Enfim, não podem os princípios do contraditório e da ampla defesa transformarem-se em abuso de direito (“Matrix”), tampouco serem mitigados em razão dessas praticas inescrupulosas feitas por poucos.


Há um liame tênue entre eles, que devem ser estabelecidos pela ética daqueles que operam dia – a – dia o direito de defesa.


Desta forma a prestação jurisdicional efetiva em tempo razoável (“Neo”) faz com que a Justiça, por meio do Direito, deixe de ser um símbolo, para se revelar no mundo real seus valores essenciais.


quarta-feira, 2 de setembro de 2009

O SISTEMA DE INFORMAÇÕES DE CRÉDITO DO BANCO CENTRAL (SCR) - UM ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO CAMUFLADO.

A fim de evitar fraudes no sistema financeiro do país, o Banco Central do Brasil, por meio da Resolução nº 2.390/97, criou o Sistema Central de Risco de Crédito (CRC), alterado para Sistema de Informações de Crédito do Banco Central (SCR), pela circular nº 3.098/02, disciplinando sua operabilidade.

O Sistema de Informação de Crédito (SCR) constitui-se num instrumento de registro e consulta de informações sobre as operações de crédito, avais e finanças prestados e limites de crédito concedidos por instituições financeiras a pessoas físicas e jurídicas do país.

Tem por escopo auxiliar o BACEN, através das carteiras de crédito das instituições financeiras, a fazer uma análise acerca do mercado de capitais, para detectar e prevenir crises bancárias. Gera efeito na diminuição do SPREAD bancário, com as informações encaminhadas pelas instituições financeiras. Não tem cunho restritivo, apesar de constar o estado de adimplência ou inadimplência da pessoa cadastrada.

No Sistema Financeiro Nacional, o SCR atua como um órgão informativo das operações que nele são realizadas.

De acordo com a circular do BACEN, as responsabilidades pelas informações inseridas no SCR são de responsabilidade exclusiva da instituição financeira informante.

Além disso, o BACEN fornece à pessoa que esteja incluída no sistema SCR, informações sobre o que consta a seu respeito; e, no caso de inexatidão de informação, segundo a circular nº 3.098/02, a exclusão ou retificação fica a cargo da instituição bancária fornecedora da informação.

Enfim, o BACEN é o órgão que instituiu o sistema do SCR, sendo o gestor e fiscalizador.

Em tese, o SCR distingue-se dos tradicionais órgãos de proteção ao crédito (SERASA, SCPC, CADIN, etc.), pois estes auxiliam o mercado na concessão de crédito ou não para seus clientes, através de consulta aos seus cadastros.

Mas, na prática, a realidade é outra.

Afinal, as instituições financeiras fazem sim do SCR um meio impeditivo de concessão de crédito, nos moldes dos órgãos de proteção ao crédito.

Exemplificando: ainda que uma pessoa não tenha quaisquer restrições, seja na Serasa ou numa outra entidade cadastral de proteção ao crédito, mas esteja cadastrada no SCR com a informação Crédito Baixado em Prejuízo, com certeza, não conseguirá realizar operações financeiras à crédito com qualquer instituição bancária.

Para que os órgãos de proteção ao crédito possam incluir em seus cadastros informações restritivas acerca da pessoa, se faz necessário que sejam atendidas certas imposições legais, principalmente, aquelas previstas no artigo 43 do Código de Defesa do Consumidor, tais como: informação prévia e por escrito; informação clara, verdadeira e de fácil compreensão e prazo máximo de cinco anos.

Em contrapartida, o SCR do BACEN reporta-se, em tese, única e exclusivamente à Circular nº 3.098/02, que não contempla o prazo de permanência da informação, nem prevê que antes da inclusão da pessoa naquele sistema, a mesma seja informada previamente e por escrito.

Ante a falta de previsão específica concernentea defesa dos interesses daqueles que são cadastrados no SCR, as instituições bancárias abusam deste mecanismo, que até então, é um instrumento a serviço do BACEN, conforme acima aludido.

Criou-se um verdadeiro sistema de restrição do crédito, próprio das instituições financeiras regulamentadas pelo BACEN, que não atendem os limites legais impostos pelo CDC, ante a falta de fiscalização das entidades relacionadas a proteção dos interesses dos consumidores e também da falta de informação adequada sobre o sistema SCR.

O uso indiscriminado do SCR do BACEN pelas instituições financeiras, faz que o mesmo se torne um órgão “camuflado” de proteção ao crédito.

Sendo assim, por ser o BACEN um órgão público, fiscalizador e gestor do SCR, e em razão do uso indevido e indiscriminado do SCR como um órgão de proteção ao crédito, as mesmas regras limitadoras dos órgão de proteção ao crédito devem ser aplicadas àquele sistema do Banco Central, a fim de evitar constrangimentos a honra e intimidade das pessoas.

Ou seja, o Código de Defesa do Consumidor, por ser uma norma infraconstitucional ordinária de ordem pública, superior a qualquer tipo de Resolução ou Circular emitida pelo BACEN, incide sobre o SCR, devendo/podendo os consumidores nele cadastrados tomarem as medidas necessárias cabíveis à proteção de seu trafego negocial.

Nesse caso, o texto escrito por SHAKESPEARE, em de Ricardo III – ato I, ilustra bem a importância do nome livre de máculas:


"Minha alma é minha honra, meu futuro de ambas depende. Serei homem morto, se privarem de honra, do conforto de um nome imaculado.”

Por derradeiro, embora na teoria a natureza e função do SCR sejam totalmente distintas dos órgãos de proteção ao crédito; na prática, o que se vê é o contrário, pois as instituições bancárias destoaram o sistema implantado pelo Banco Central, utilizando-o como um meio restritivo de crédito, de caráter interno, para esquivar-se das regras contidas em lei, principalmente, no Código de Defesa do Consumidor (CDC).